Pela primeira vez na história, a Portuguesa foi rebaixada para a Série C. Culpa do tapetão, da má gestão ou da Lei Pelé?
São Paulo, SP, 28 (AFI) – Sexta-feira, 28 de outubro de 2014, 21h30. O torcedor da Portuguesa nunca mais se esquecerá desta data e horário. Com a derrota para o Oeste por 3 a 0, no estádio dos Amaros, em Itápolis, a Lusa, pela primeira vez em seus 94 anos, foi rebaixada para a Série C do Campeonato Brasileiro, a Terceira Divisão do futebol brasileiro.
“Da tua glória, toda a certeza, que tu és grande, ó Portuguesa”. O trecho do hino da Associação Portuguesa de Desportos não é mentiroso. O clube, que melhor define a colônia lusitana no futebol, já assombrou clubes gigantes do futebol brasileiro durante os seus tempos áureos, lutando por títulos no Campeonato Brasileiro e no Campeonato Paulista.
Nas décadas de 1930, 1970 e 1990, a Portuguesa conseguia entrar para o seleto grupo dos grandes paulistas, ao lado dos multicampeões Corinthians, Palmeiras, Santos e São Paulo. Em 1936 e 1973, conquistou o principal Estadual do Brasil, em uma época em que as competições regionais eram até mais importantes que o título brasileiro. Em 1996, um esquadrão comandado por Zé Roberto e Rodrigo Fabri deixou todos o país boquiaberto e terminou como vice-campeão nacional.
De lá para cá, entretanto, a Lusa começou a se “apequenar”. O orgulho do torcedor lusitano, que enxia e fazia do Canindé uma das festas mais bonitas do futebol, passou a virar vergonha, rebaixamentos, dívidas e humilhações. Má gestão, diretoria ultrapassada, sucessão de poderes a uma pessoa só e até erros judiciários fizeram da campeã uma mera coadjuvante no futebol brasileiro.
Foto do Estádio Osvaldo Teixeira Duarte "Canindé" em São Paulo |
A LEI PELÉ E O INÍCIO DA DERROCADA
Em 1998, foi extinta no país a então chamada como “lei do passe” e criada a Lei Pelé, que tirava dos clubes o poder sobre o passe dos seus jogadores, dando ao atleta e seus agentes, o poderio de livre negociação. Como a maioria dos clubes brasileiros, a Lusa não estava preparada para a nova lei e acabou perdendo um de seus maiores bens: a revelação de grandes jogadores através das categorias de base. A história que ganhou mais repercussão foi do atacante Ricardo Oliveira, que em 2003 se transferiu para o Santos sem que a Lusa recebesse qualquer valor pela negociação.
Com a chegada de Manuel da Conceição Ferreira, o Manuel da Lupa, à presidência da Portuguesa, em 2005, esperava-se que o clube voltasse ao rumo de conquistas e de grandeza, mas o que se viu foi algo ainda pior: uma má gestão, empréstimos e contratações ruins, que levaram a Lusa a inúmeras dívidas trabalhistas.
Com discurso pronto e representando uma diretoria que tentava fazer o melhor, mas que se tornou ultrapassada, Da Lupa conseguiu a reeleição quatro vezes, dando continuidade a uma gestão que aos poucos deixava o clube em cacos. Ele foi substituído por Ilídio Lico, atual presidente, a partir de dezembro de 2013. O problema é que assim como Da Lupa, Lico também representa uma safra de dirigentes do passado, tendo já sido vice-presidente de futebol do clube em 1994 e 2001.
REBAIXAMENTOS E HUMILHAÇÕES
Clube repleto de glórias, a Portuguesa só teve o seu primeiro rebaixamento após 82 anos de história. Em 2002, com um time montado durante a competição, a Portuguesa acabou pagando pela falta de planejamento e terminou o Campeonato Brasileiro na 23ª posição, ficando com a última vaga na zona de degola. Diante da péssima situação financeira e novamente montagens ruins de times, a Lusa só retornou para a elite em 2008, depois de terminar a Série B de 2007 na terceira posição. Voltaria para a Segunda Divisão no mesmo ano.
No Campeonato Paulista, competição infinitamente mais fraca que o Campeonato Brasileiro, a Portuguesa também foi rebaixada duas vezes. Em 2006 e em 2012. Na disputa da Série A2 de 2013, conseguiu o título, mas não sem antes passar vergonha, chegando a perder por 7 a 0 para o Comercial no Quadrangular Final.
“BARCELUSA” E REBAIXAMENTO NO TAPETÃO
Durante todo este período de dívidas, derrotas e rebaixamento, o torcedor lusitano se manteve apoiando o time, mesmo podendo comemorar de verdade apenas uma vez. Durante o Campeonato Brasileiro da Série B, a Portuguesa montou um time interessante e apostou no até então técnico promissor, Jorginho, que vinha de um bom trabalho anterior no Palmeiras. Jogando de forma ofensiva, se preocupando muito mais em marcar gols do que de não levar, o clube foi campeão da competição, com incríveis 81 pontos e 82 gols marcados.
A grande campanha lusitana e o bom futebol demonstrado dentro de campo fez com que aquele time recebesse o apelido de “Barcelusa”, referência ao clube catalão que encantava o mundo com Iniesta, Xavi e Messi e que tinha imposto o estilo “Tiki-Taka”, que valorizava a posse de bola e a troca de passes no meio-campo. No ano seguinte, com muito sacrifício, a Lusa se livrou do rebaixamento no Brasileirão a duas rodadas do final do campeonato, terminando a uma posição da zona de degola.
Em 2013, depois de retornar para a elite do futebol paulista, a Portuguesa novamente sofreu, mas com um bom trabalho de Guto Ferreira, terminou o Brasileirão fora da zona de rebaixamento. Uma escalação irregular do jogador Héverton, no último jogo contra o Grêmio, porém, fez com que o clube perdesse quatro pontos no STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva) e, assim, caindo para a 17ª posição, acabou rebaixada.
Alegando não ter sido informada sobre a punição a Héverton na sexta-feira, dois dias antes do jogo com o Grêmio, a Portuguesa culpou o advogado Osvaldo Sestário, a própria CBF e o STJD, que estariam agindo em favor do Fluminense (beneficiado com o rebaixamento da Lusa) e não do futebol, porém, perdeu por unanimidade nos dois plenos do Tribunal.
2014: O ANO QUE O LUSITANO QUER ESQUECER
Nunca na história da Portuguesa, um ano começou tão conturbado como 2014. Com um novo presidente, que ainda “não sabia” da real situação financeira do clube e ainda lutando na justiça contra o rebaixamento no Brasileirão, o Campeonato Paulista foi praticamente deixado de lado e o time não conseguiu avançar para as quartas de final, terminando em terceiro lugar no Grupo C.
Preferindo gastar o seu pouco dinheiro em cofre para pagar advogados que brigariam pela vaga no Brasileirão a montar um time competitivo para a disputa da Série B, a Portuguesa protagonizou a pior campanha de sua história e acabou rebaixada na lanterna, com apenas 21 pontos, com cinco rodadas antes do final. Em 2015, a Portuguesa disputará, pela primeira vez, a Série C do Campeonato Brasileiro.
AINDA EXISTE SALVAÇÃO?
Na visão do torcedor lusitano, que não aguenta mais ver o time um dia campeão se “apequenando”, a esperança não acaba. Alguns pedem a saída de toda a diretoria e outros, acreditam que só com a reativação de uma categoria de base forte será possível sair da atual situação.
Recentemente, o clube recebeu uma proposta para se tornar um clube-empresa. Mário Teixeira, um dos principais acionistas do Banco Bradesco e do Audax Osasco, gostaria de criar a Lusa Audax, mas a diretoria da Portuguesa entendeu que a proposta era absurda.
Outros analistas avaliam que os problemas da Portuguesa só acabarão após sanados todos os problemas de dívidas trabalhistas e a única forma de obter este dinheiro, sem aumentar a quantidade de empréstimos seria vender o terreno do estádio Canindé, maior patrimônio do clube depois de sua torcida. Com o Pacaembu ficando mais desocupado com as criações das Arena Palmeiras e do Corinthians, a Lusa tornaria o estádio Municipal Paulo Machado de Carvalho a sua nova “casa”.
Denner, Enéas, Djalma Santos, Paulinho McLaren, Leivinha...todos estes craques do futebol brasileiro têm algo em comum: honraram e colocaram a Portuguesa no tamanho que ela sempre mereceu. Se a diretoria se espelhar no exemplo deixados por eles dentro de campo, já é um belo começo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário